Na
execução de sentença homologatória de acordo celebrado entre as
partes no âmbito civil, é possível a penhora de imóvel
residencial tido como bem de família, se o executado foi condenado
criminalmente pelo mesmo fato. A decisão é da Quarta Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar recurso em que se
alegava a nulidade da penhora de um imóvel, tendo em vista a não
inclusão da circunstância na exceção prevista pelo inciso VI do
artigo 3º da Lei 8.009/90.
A Quarta
Turma entendeu que a influência da condenação penal na esfera
civil é caso em que se aplica a exceção prevista no inciso VI do
artigo 3º da Lei 8.009, desde que idênticos os fundamentos de fato
que embasaram a decisão, mesmo não se tratando de liquidação e
execução direta do título estabelecido no âmbito criminal.
A Lei
8.009 instituiu a impenhorabilidade do bem de família como
instrumento de tutela do direito de moradia e dispõe a
impossibilidade da penhora nos casos de dívida civil, comercial,
fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos
cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários ou
que nela residam.
O inciso
VI do artigo 3º permite a penhora se o imóvel foi adquirido como
produto de crime ou para execução de sentença penal que determinou
ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.
Lesão
corporal
No caso
julgado pela Quarta Turma, a penhora foi efetuada para garantia de
dívida originária de ação de indenização por infração às
normas de trânsito, que resultou em acidente. As partes fizeram
acordo quando já havia sentença penal condenatória transitada em
julgado, por lesão corporal culposa, que também ensejou a ação
civil.
A Quarta
Turma entendeu que, na execução ou cumprimento de sentença
homologatória de acordo entre as partes, deve ser reconhecida a
penhorabilidade se o executado foi condenado criminalmente pelo mesmo
fato, caso em que se aplica a exceção prevista no artigo 3º da Lei
8.009.
Segundo o
relator, ministro Luis Felipe Salomão, a impenhorabilidade do bem de
família, dada a sua importância social, somente pode ser superada
quando houver transgressão à norma penal, com concomitante ofensa à
norma civil, resultando, após o trânsito em julgado da sentença
criminal condenatória, no dever de ressarcimento do prejuízo
causado pela prática do delito.
O
Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), ao analisar o caso,
verificou a coexistência das sentenças civil e penal, esta
condenando a ré pelo mesmo fato – lesão corporal culposa
decorrente de acidente de trânsito. Houve acordo para a reparação
dos danos, homologado judicialmente, mas não foi cumprido, e o
credor entrou com a execução.
Efeitos
extrapenais
A
devedora alegou que a circunstância não autorizava a penhora, pois
não se tratava de execução de sentença penal, mas de sentença
civil, não abrangida pela exceção trazida na lei. A ação penal
por lesão culposa não a teria condenado ao pagamento de nenhum
valor.
O
ministro Salomão observou que a condenação criminal gera efeitos
extrapenais, alguns dos quais, por serem genéricos, não precisam
ser tratados pelo juiz na sentença. Um desses efeitos genéricos da
sentença penal condenatória é a obrigação de o agente reparar o
dano causado pelo crime, sem necessidade de que esse dano seja
provado na área civil, pois já foi provado no processo criminal. É
o que diz o artigo 91 do Código Penal, ao estabelecer que a
condenação torna certa a obrigação de indenizar a vítima.
O relator
explicou que, como a legislação sobre o bem de família é de
natureza excepcional, o inciso VI do artigo 3º não pode ter
interpretação extensiva. Além disso, pelo princípio da
intervenção mínima, a atuação do direito penal ocorre apenas
subsidiariamente, ou seja, quando os demais ramos do direito não
forem suficientes para a proteção adequada dos bens jurídicos que
assumem maior relevância e que são alvo de ataques mais graves.
“De
fato, o caráter protetivo da Lei 8.009 impõe sejam as exceções
nela previstas interpretadas estritamente”, disse o ministro. Nesse
sentido, “a ressalva contida no inciso VI do artigo 3º encarta a
execução de sentença penal condenatória – ação civil ex
delicto –, não alcançando a sentença civil de indenização,
salvo se, verificada a coexistência dos dois tipos, lhes forem comum
o fundamento de fato, exatamente o que ocorre nestes autos”,
concluiu Salomão.
Fonte
site STJ
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