A
Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que
dará direito a crédito de Imposto sobre Circulação de Mercadorias
e Serviços (ICMS) a entrada de energia elétrica transformada em
impulsos eletromagnéticos pelas concessionárias de telefonia móvel.
Para os ministros, a atividade realizada pelas empresas de
telecomunicação constitui processo de industrialização e a
energia elétrica é insumo essencial para o seu exercício.
O
entendimento foi dado no julgamento de recurso da Telemig Celular
contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). O
tribunal estadual havia reformado a decisão de primeiro grau e
considerado não ser possível o creditamento do ICMS pago na compra
da energia elétrica utilizada por prestadora de serviço de
telecomunicações.
O TJMG se
baseou na Lei Complementar 87/96, alterada pela Lei Complementar
102/00, a qual prevê que a entrada de energia elétrica no
estabelecimento dará direito ao crédito quando for consumida no
processo de industrialização. Para o tribunal mineiro, os serviços
de telecomunicação não se caracterizam como atividade industrial.
Inconformada
com a posição do TJMG, a Telemig ingressou com recurso no STJ.
Nesta Corte, o recurso foi submetido à sistemática dos recursos
repetitivos, disposta no artigo 543-C do Código de Processo Civil,
considerando a relevância e a multiplicidade de recursos sobre a
mesma questão.
A empresa
argumentou que houve violação à LC 87, que regulamentou referido
imposto. Apontou que a Constituição Federal determina que o
princípio da não-cumulatividade seja disciplinado por lei
complementar, sendo vedado à legislação infraconstitucional
restringir o alcance das disposições constitucionais.
Alegou
que, “para garantir o preceito da não-cumulatividade, evitando-se
a dupla tributação pelo fisco estadual, somente há uma solução:
se no momento da aquisição de energia elétrica a autora é o
contribuinte de fato do ICMS sobre a mercadoria adquirida (energia
elétrica) e, após a transformação da energia adquirida em
impulsos eletromagnéticos (telecomunicação) a autora passa a ser a
contribuinte do ICMS-serviços de telecomunicação, imperioso se
apresenta garantir o direito ao crédito oriundo da primeira
operação”.
Amici
curiae
Todos os
estados do Brasil, o Distrito Federal e o Sindicato das Empresas de
Telefonia e de Serviço Móvel Celular e Pessoal (Sinditelebrasil)
puderam se manifestar nos autos, na qualidade de amici curiae.
O estado
de São Paulo afirmou que não há caráter industrial na atividade
exercida pelas empresas de telecomunicações e que as limitações
ao creditamento do ICMS não ofendem o princípio da
não-cumulatividade.
“O fato
de a empresa utilizar energia elétrica para simples geração de
ondas eletromagnéticas, necessárias à prestação dos serviços de
telefonia, não a converte em empresa industrial”, destacou São
Paulo.
O Ceará
mencionou que “o creditamento de ICMS pago no consumo de energia
elétrica por parte da empresa prestadora de serviço de
telecomunicação ofende o disposto no artigo 33 da LC 87, com a
redação dada pela LC 102/00, que veda o aproveitamento de crédito
relativo à energia elétrica no caso de consumidor não industrial”.
Mantendo
o mesmo entendimento, o Distrito Federal e os outros estados
argumentaram não ser possível o aproveitamento do crédito com
fundamento na natureza da atividade, pois não ocorre
industrialização no processo de telefonia. Para os entes
federativos, “é inadmissível atribuir uma natureza híbrida às
empresas de telecomunicações, de acordo com a conveniência delas”.
Apontaram
que a Constituição considera a telecomunicação prestação de
serviço e não indústria, e que não é razoável aceitar que um
ramo empresarial ora seja considerado prestador de serviços, “para
deixar de pagar preço público”, ora seja qualificado como
atividade industrial, “para obter créditos de ICMS”.
O
Sinditelebrasil discordou da argumentação trazida pelos estados e
pelo DF. Sustentou que a energia elétrica consiste em insumo
essencial para a prestação dos serviços de telecomunicações.
Defendeu ainda que esses serviços consistem em processo de
transformação de energia, sendo, portanto, processo de
industrialização.
Atividade
industrial
O acórdão
do TJMG também possuía aspectos constitucionais, que foram
impugnados pela Telemig em recurso extraordinário perante o Supremo
Tribunal Federal. No STJ, a posição do relator do recurso, ministro
Sérgio Kukina, foi acompanhada pela maioria dos ministros.
A
Primeira Seção entendeu que o serviço de telecomunicação é
caracterizado como processo de industrialização. Também decidiu
que o princípio da não-cumulatividade permite o aproveitamento do
crédito de ICMS relativo ao insumo energia elétrica pelas
prestadoras do serviço.
Kukina
explicou que o Decreto 640/62 equiparou os serviços de
telecomunicações à indústria básica. O relator trouxe como
precedente o Recurso Especial (REsp) 842.270, da relatoria do
ministro Castro Meira, que concluiu que o decreto é compatível com
o Código Tributário Nacional (CTN) e com a legislação atual.
Para
Castro Meira, “o fato de uma lei catalogar uma atividade como
serviço não invalida a equiparação com a indústria adotada em
outra norma legal de mesma ou maior hierarquia”. De acordo com ele,
a Lei 9.472/97 utiliza o termo “indústria de telecomunicações”
e deixa claro que “essa atividade, embora catalogada como serviço,
encerra um processo equiparável ao industrial, pois transforma
energia elétrica em sinais sonoros e visuais”.
O
ministro Kukina também salientou que o Decreto 640/62 foi editado
pelo presidente do Conselho de Ministros, conforme autorizava o
artigo 18, III, do Ato Adicional à Constituição Federal de 1946
(EC 4/46), e, até o presente momento, não foi revogado
expressamente, a exemplo do que aconteceu com diversos decretos
instituídos nesse mesmo período.
Kukina
também observou que o artigo 19 da LC 87 anotou a não-cumulatividade
para o ICMS e previu que a compensação fosse devida em cada
operação relativa à prestação de serviços de comunicação.
Asseverou
que “essa desenganada percepção acerca da essencialidade da
energia elétrica na prestação dos serviços de telecomunicação,
sem dúvida, faz legitimar a incidência, na espécie, do princípio
da não-cumulatividade. Isso porque, conforme firmado no voto-vista
do ministro Castro Meira, ainda no REsp 842.270, referido princípio
comporta três núcleos distintos de incidência: (I) circulação de
mercadorias; (II) prestação de serviços de transporte; (III)
serviços de comunicação”.
Para os
ministros, não existe dúvida sobre o direito ao crédito do ICMS,
em atendimento ao princípio da não-cumulatividade, em virtude de a
energia elétrica, como insumo, ser essencial para o exercício da
atividade de telecomunicações.
Com esse
entendimento, o STJ deu provimento ao recurso da Telemig, para
possibilitar o crédito do imposto à empresa. Por estar submetido ao
rito dos recursos repetitivos, o entendimento deverá ser aplicado
aos demais julgamentos sobre a mesma questão.
Fonte
site STJ
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