O direito
foi criado para regular a vida em sociedade e, com vistas a
garanti-lo, instituiu-se a Justiça. É do advogado o papel
indispensável de servir de elo entre a parte e o direito que lhe
cabe. A contrapartida ao esforço empreendido por esse profissional
na defesa dos interesses de seus clientes são os honorários
advocatícios, motivo que leva, muitas vezes, quem tem o dever de ser
o elo a se transformar em parte.
Valor
excessivo, verba irrisória, recusa em pagar, se é o advogado quem
deve... Muitos são os casos que vão parar na Justiça com vistas a
equilibrar a relação entre o advogado, o seu cliente e a outra
parte. Veja o que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem decidido
sobre o assunto.
Vencedor
condenado a pagar
Em um dos
recursos julgados no Tribunal, um réu que, mesmo vencedor na ação,
foi condenado a pagar, juntamente com os autores, os honorários do
advogado da corré, também vencedora. Ele tentava a evitar o
pagamento, mas a Terceira Turma concluiu que a decisão que enfrentou
o mérito da ação e transitou em julgado não pode ser modificada
por exceção de pré-executividade.
Na ação
primária, ajuizada no Judiciário amazonense contra o espólio de um
segurado e um de seus beneficiários, buscava-se a anulação de
contrato de seguro de vida. As empresas de seguro contestaram o
pagamento da indenização porque o falecido, apesar de ter sido
vítima de homicídio (morte violenta), não teria declarado, à
época da assinatura do contrato, que sofria de hipertensão
arterial.
A ação
foi julgada improcedente e os autores, condenados, juntamente com o
espólio, a pagar honorários ao advogado do outro réu. O réu
condenado apresentou embargos de declaração, alegando que teria
havido “erro material”, já que foi vencedor no processo e não
poderia ser responsabilizado pelo pagamento de honorários à outra
parte ré. Ao final, a condenação foi mantida em todas as
instâncias e transitou em julgado.
Ao
analisar a questão, a relatora, ministra Nancy Andrighi, reconheceu
a peculariedade do caso. “Por maior que possa ser a estranheza
causada pela condenação do corréu ao pagamento de honorários
advocatícios ao seu litisconsorte em ação vencida por ambos”,
essa circunstância, segundo a ministra, foi ressaltada em recurso
próprio, e a juíza de primeiro grau, mesmo alertada do fato,
manteve na íntegra a condenação.
Nancy
Andrighi destacou, ainda, que a condenação a honorários foi
estabelecida e enfrentou o mérito da ação. Nesse caso, tanto a
condenação principal como o resultado dela adquirem a “eficácia
de coisa julgada”, e não podem mais ser contestados por exceção
de pré-executividade (REsp 1.299.287).
Execução
provisória
Em outro
recurso, interposto por uma associação hospitalar, a Quarta Turma
entendeu que não cabe fixação de honorários advocatícios no
cumprimento da sentença quando esta se encontra ainda na fase de
execução provisória.
A
associação recorreu ao STJ contra julgado que permitiu o
arbitramento de honorários. Defendia que os honorários podem ser
cobrados na fase de cumprimento de sentença. Entretanto, sustentou
que o momento processual não seria adequado, pois ainda havia
recursos pendentes na ação.
O
relator, ministro Luis Felipe Salomão, afirmou que o tratamento dado
à execução provisória deve ser diverso da execução definitiva.
Para ele, o artigo 475-O do Código de Processo Civil (CPC), que
regula a execução provisória, determina que as execuções terão
tratamento igualitário apenas no que couber.
Salomão
também reconheceu a possibilidade da fixação dos honorários
advocatícios duante o cumprimento de sentença, conforme regra
introduzida pela Lei 11.232/05. “Não obstante, o que deve ser
observado para a definição do cabimento de honorários advocatícios
é o princípio da causualidade”, comentou (REsp 1.252.470).
Entendimento
contrário
Embora o
recurso da associação hospital tenha sido provido de forma unânime,
o ministro Antonio Carlos Ferreira, mesmo acompanhando o relator,
sustentou entendimento diferente. Segundo ele, “o critério para a
fixação do ônus da sucumbência não deve ser a natureza do
cumprimento de sentença (provisório ou definitivo), mas sim a
resistência por parte do executado”.
Para
Antonio Carlos Ferreira, se houver impugnação ou recusa ao
pagamento, os honorários devem ser arbitrados na execução
provisória – “seja pela causualidade (decorrente do não
pagamento espontâneo, demandando novos do exequente), seja pela
sucumbência (no caso de impugnação afastada)”.
A
Terceira Turma do STJ tem posicionamento totalmente oposto ao da
Quarta, no sentido de ser cabível a estipulação de honorários
advocatícios em sede de execução provisória. Esse entendimento
pode ser conferido no agravo regimental no AREsp 48.712, da relatoria
do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.
Reparação
Ao
analisarem um processo que discutia se honorários advocatícios
devem entrar na condenação por perdas e danos, a Terceira Turma
concluiu que a parte que deu causa ao processo deve suportar as
despesas tidas pela parte contrária com advogados. Para os
ministros, os honorários advocatícios contratuais integram os
valores devidos como reparação por perdas e danos.
A
Companhia de Seguros Minas Brasil recorreu contra decisão do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que a condenou a
restituir os honorários de advogado que haviam sido pagos pela
transportadora Transdelta em uma ação de cobrança. A
transportadora ingressou em juízo alegando que a seguradora se
negava a pagar os prejuízos sofridos em razão de acidente com um
veículo segurado.
Além da
cobertura do acidente, a transportadora exigiu reparação pelos
danos materiais e morais que diz terem sido causados pela recusa da
seguradora, inclusive as despesas com a contratação de advogados
para realizar a cobrança judicial.
A
relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, disse em seu voto que o
Código Civil de 2002 – nos artigos 389,395 e 404 – traz previsão
expressa de que os honorários advocatícios integram os valores
relativos à reparação por perdas e danos. Ela esclareceu que os
honorários citados no código são os contratuais e não devem ser
confundidos com os de sucumbência – aqueles que a Justiça
determina que o perdedor pague ao advogado do vencedor.
“Os
honorários sucumbênciais, por constituírem crédito autônomo do
advogado, não importam em decréscimo patrimonial do vencedor da
demanda. Assim, como os honorários convencionais são retitados do
patrimônio da parte lesada – para que haja reparação integral do
dano sofrido –, aquele que deu causa ao processo deve restituir os
valores despendidos com os honorários contratuais”, afirmou a
relatora (REsp 1.027.797).
Cumulação
honorária
O STJ
reconhece a possibilidade de dupla condenação em honorários
advocatícios fixados na ação de execução com aqueles arbitrados
nos respectivos embargos do devedor. O entendimento é da Primeira
Turma que reformou acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª
Região (TRF4).
O
contribuinte – massa falida de uma empresa de produtos químicos –
recorreu ao STJ contra o entendimento do TRF4, segundo o qual os
honorários advocatícios fixados nos embargos à execução
substituiram aqueles fixados provisioriamente na execução fiscal.
O
contribuinte alegou que são devidos os honorários advocatícios por
aquele que se deu causa à demanda (a União), já que a execução
fiscal foi considerada extinta depois que a massa falida foi obrigada
a constituir advogado para a sua defesa. O advogado teve, inclusive,
que apresentar manifestações e impugnar os cálculos do ente
público.
A
Primeira Turma deu razão ao contribuinte, pois os embargos do
devedor são mais do que mero incidente processual e constituem
verdadeira ação de conhecimento. A conclusão é a de que os
embargos à execução não possuem natureza jurídica recursal, mas
constituem ação autônoma, o que impõe que o patrono da causa, a
quem é vedado exercer a profissão de forma gratuita, seja
remunerado pelos esforços despendidos para o sucesso da causa (REsp
1.212.563).
Juros
moratórios
Mesmo que
não haja dúvidas quanto à obrigação de pagar os honorários, a
questão pode virar uma contenda judicial para definir quando pagar.
De acordo com decisao da Segunda Turma, consolida-se a obrigação de
pagar os honorários a partir do trânsito em julgado da sentença. O
não pagamento deles enseja juros moratórios, os quais incidem no
cálculo dos honorários advocatícios a partir do trânsito em
julgado do aresto ou da sentença em que foram fixados.
O tema
foi discutido no julgamento de um recurso especial contra decisão do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). O principal argumento
foi o de que a mora somente existiria após o vencimento da obrigação
não cumprida. O marco temporal seria o trânsito em julgado da
sentença que condenou o estado ao pagamento dos honorários
advocatícios oriundos da sucubência.
Para o
relator, ministro Mauro Campbell Marques, sendo legítima a inclusão
de juros de mora na condenação em honorários, ainda que não
solicitado na inicial ou não previsto na sentença, deve-se fxar o
termo inicial da sua incidencia. Dessa forma, para que sejam cobrados
juros moratórios é preciso que exista a mora, que ocorre a partir
do trânsito em julgado da sentença (REsp 771.029).
Moeda
estrangeira
Também
se questiona na Justiça se o pagamento dos honorários pode se dar
em moeda estrangeira. A Quarta Turma decidiu que, mesmo que fixados
em moeda estrangeira, os honorários devem ser pagos em moeda
nacional.
A Turma
rejeitou os argumentos apresentados por uma empresa que acertou com o
advogado o pagamento dos honorários advocatícios em dólar. Segundo
os ministros, o contrato pode ser feito em moeda estrangeira, mas o
pagamento deve ocorrer em moeda nacional.
No caso
julgado, o termo de compromisso firmado entre a empresa e o advogado
estabelecia como honorários advocatícios o pagamento de 20% do
valor de U$ 80 mil, objeto de ação movida contra um frigorífico.
Como apenas uma parte dos honorários foi paga, o advogado ajuizou
ação para receber o restante, U$ 9.107,77, o que equivalia, na data
do ajuizamento, a R$ 26.057,33.
A empresa
havia sustentado que o estabelecimento de contratos em moeda
estrangeira fere o artigo 1° do Decreto-Lei 857/69, o qual dispõe
que são nulos os contratos e obrigações que estipulem pagamento em
ouro, moeda estrangeira ou que, de alguma forma, restrinjam ou
recusem o curso legal da moeda nacional. Afirmou, ainda, que
considerou exagerada a fixaçaõ dos honorários em 20% do valor da
condenação.
Ao
analisar o caso, o relator, ministro Luis Felipe Salomão, destacou
que o decreto-lei não proíbe a celebração de pactos e obrigações
em moeda estrangeira, mas veda o pagamento em outra espécie que não
a moeda nacional. Quanto aos critérios que levaram o tribunal de
origem a fixar a verba advocatícia, o ministro esclareceu que não
poderia revê-los, por vedação expressa na Súmula 7 do STJ (REsp
885.759).
Defensoria
Pública
Muitos
são os casos envolvendo honorários advocatícios e Defensoria
Pública. No julgamento do Recurso Especial 1.108.013/RJ, a Corte
Especial definiu que são devidos honorários advocatícios à
Defensoria Pública quando a atuação se dá em face de ente
federativo diverso do qual é parte integrante. Eles não são
devidos apenas quando a Defensoria atua contra a pessoa jurídica de
direito público da qual é parte.
Quando a
Defensoria Pública está no exercício da curadoria especial, não
cabem honorários, uma vez que essa função faz parte de suas
atribuições institucionais. A Terceira Turma enfrentou recentemente
o tema. No caso, um defensor público do estado de São Paulo foi
nomeado curador especial de uma cidadã em ação de despejo cumulada
com cobrança de aluguéis ajuizada contra ela. Foi indeferido pedido
de antecipação dos honorários advocatícios à Defensoria Pública
de São Paulo, chegando a discussão ao STJ.
Para a
Defensoria, os honorários do curador especial enquadram-se no
conceito de despejas judiciais e, portanto, estão sujeitos ao
adiantamento. Alegou, ainda, que os honorários são devidos mesmo
que a curadoria seja exercida por defensor público, não podendo ser
dado tratamento diferenciado, no que diz respeito à verba honorária,
daquele que seria dispensado ao curador especial sem vínculo com o
estado e o defensor público.
Em seu
voto, a relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que a Lei
Complementar 80/94 determina que é função institucional da
Defensoria Pública “exercer a curadoria especial nos casos
previsto em lei”. Segundo ela, “sendo o exercício da curadoria
especial função institucional da Defensoria Pública, descabe a
fixação de honorários advocatícios pelo exercício do referido
encargo”.
Nancy
Andrighi ressaltou, ainda, que, apesar da impossibilidade de
percepção de honorários advocatícios pelo exercício de sua
função institucional, são devidos à Defensoria Pública, enquanto
instituição, os honorários advocatícios decorrentes de regra
geral de sucumbência (REsp 1.203.312).
Acordo
direto
Em outro
julgamento, a Corte Especial definiu o alcance de dispositivo legal
sobre honorários. Para a Corte, a determinação de que cada uma das
partes se responsabilize pelo pagamento dos honorários de seus
próprios advogados, quando houver acordo direto para encerrar
processo judicial envolvendo a Fazenda Pública Federal, não é
válida para as composições firmadas antes da vigência da Medida
Provisória 2.226/01.
Esse
entendimento, já adotado em outras decisões pelo Tribunal, foi
reafirmado em julgamento da Corte Especial submetido ao rito dos
recursos repetitivos, previsto pelo artigo 543-C do Código de
Processo Civil. O dispositivo que trouxe a determinação havia sido
suspenso em 2007 por liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), mas
os ministros do STJ entenderam que isso não afetava o caso julgado,
pois o acordo em discussão fora firmado antes da MP, cuja norma não
tinha efeito retroativo (REsp 1.218.508).
Fonte
site STJ
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