O novo projeto de lei que foi apelidado de “lei da palmada” é um retrocesso no Direito brasileiro. Está na contramão do desenvolvimento da Ciência Jurídica e é fruto de mentes oportunistas e descompromissadas. Digo isso porque já houve tempo em que o Estado estava dentro da casa do indivíduo (a polícia investigava quem frequentava a moradia de quem), regulava seu relacionamento com os vizinhos (através do guarda-civil chamado inspetor-de-quarteirão) e o excluía do convívio social caso transparecesse uma opinião política incômoda.
Veio então a democracia, as aberturas, o afrouxamento do garrote estatal, e a sociedade deu um salto evolutivo. Deixou o Estado de influir tanto na vida dos seus cidadãos, privatizou empresas, cedeu permissões e concessões. E isso foi muito bom para o Brasil, que vinha de sucessivas ditaduras.
Agora vem uma lei dizer de que forma o indivíduo tem que educar os filhos. É a mais absurda ingerência estatal dentro do núcleo familiar dos últimos anos e tenho por mim que, assim que for publicada, sofrerá uma tempestade de ações de inconstitucionalidade. Isso porque quem tem que saber o que é melhor para o filho são seus pais. Se o Estado chama para si tal responsabilidade, poderá criar dentro do seio familiar um indivíduo sem limites, que cedo ou tarde irá delinquir. E quando isso acontecer, estará o mesmo Estado capacitado para recuperá-lo? Ou o jogará numa prisão imunda para que ali apodreça de vez?
Se a intenção é coibir excessos, já há no Código Penal brasileiro o artigo 136, que diz: “Expor a perigo a vida ou a saúde de pessoa sob sua autoridade, guarda ou vigilância, para fim de educação, ensino, tratamento ou custódia, quer privando-a de alimentação ou cuidados indispensáveis, quer sujeitando-a a trabalho excessivo ou inadequado, quer abusando de meios de correção ou disciplina: Pena - detenção, de dois meses a um ano, ou multa”. Pronto. A questão do excesso já está resolvida.
Essa nova lei cairá logo no ridículo. Primeiro porque não está o Estado lá dentro da casa do autor do fato para flagrá-lo no ato de bater no filho. Segundo porque a penalidade é administrada, não chegará a uma punição efetiva. Terceiro porque, se a criança não estiver satisfeita na casa dos pais, ali apanha de vez em quando, o que o Estado fará com ela? Irá colocá-la num abrigo de menores?
No fundo, sabe de quem é a responsabilidade por leis grotescas como essas? Somos todos nós que não sabemos votar direito, que elegemos pessoas desafinadas com a realidade nacional.
Adriano César Curado