O
julgamento de ações envolvendo seguro habitacional do Sistema
Financeiro de Habitação (SFH) é de competência da Justiça
estadual, e só excepcionalmente poderá ser transferido para a
Justiça Federal. O entendimento foi dado pela Segunda Seção do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao apreciar dois recursos em que
a Caixa Econômica Federal (CEF) pedia o deslocamento para a Justiça
Federal das causas em que se discute o pagamento de indenização por
defeitos na construção de imóveis.
A decisão
interessa diretamente a milhares de mutuários, pois a mudança para
a Justiça Federal poderia significar grande atraso na tramitação
dos processos em curso.
O tema
foi debatido conforme o rito dos recursos repetitivos, previsto no
artigo 543-C do Código de Processo Civil, e vai orientar o desfecho
de ações com a mesma controvérsia jurídica em todo o país.
De acordo
com a Segunda Seção, o risco hipotético ou remoto de afetação do
Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS), administrado
pela CEF, não autoriza o deslocamento automático das ações de
seguro habitacional para a Justiça Federal.
Falta de
solidez
Os
recursos apreciados são representativos dos casos em que mutuários
pedem indenização pela falta de solidez dos imóveis, em processos
movidos contra companhias seguradoras privadas. Os riscos de sinistro
estão cobertos pela apólice de seguro habitacional do SFH, que
acompanha a contratação de imóvel e seus financiamentos.
Por seis
votos a dois, ao julgar embargos de declaração, a Seção restaurou
a decisão firmada nos mesmos processos em 11 de março de 2009,
quando foi reconhecida a competência da Justiça dos estados para
processar e julgar essas ações.
Nos
recursos, a CEF pedia sua entrada nos processos como assistente, na
condição de administradora do seguro habitacional – por ser
empresa pública da União, isso deslocaria a competência para a
Justiça Federal. A Seção entendeu que somente haverá interesse
jurídico da CEF nas hipóteses em que os contratos estiverem
vinculados ao Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS),
as chamadas apólices públicas.
Além
disso, para que seja possível o ingresso da CEF no processo, a
instituição financeira deverá provar documentalmente não apenas a
existência de apólice pública, mas também do comprometimento do
FCVS, com risco efetivo de exaurimento da reserva técnica do Fundo
de Equalização de Sinistralidade da Apólice (Fesa), colhendo o
processo no estado em que este se encontrar no instante em que houver
a efetiva comprovação desse interesse, sem anulação de nenhum ato
processual anterior.
Sonho e
pesadelo
A
ministra Nancy Andrighi, autora do voto vencedor, destacou que a
causa é de difícil solução e reflete a preocupação de milhares
de mutuários que “viram o sonho da casa própria se transformar em
pesadelo, estando hoje na posse de imóvel com algum tipo de defeito
na construção”.
Ela
explicou que, desde a criação do SFH, por intermédio da Lei
4.380/64, até o advento da Lei 7.682/88, as apólices não eram
garantidas pelo FCVS. Com a entrada em vigor da Medida Provisória
478/09, ficou proibida a contratação de apólices públicas. A
ministra destacou que a análise quanto à legitimidade da CEF para
intervir nas ações securitárias fica restrita ao período
compreendido entre 2 de dezembro de 1998 e 29 de dezembro de 2009,
durante o qual conviveram as apólices privadas e as públicas,
garantidas pelo FCVS.
A
relatora da matéria, ministra Isabel Gallotti, que ficou vencida no
julgamento, afirmou que, diferentemente das apólices privadas, as
públicas são garantidas pelo FCVS, havendo, nesses casos, interesse
da CEF. Nessa hipótese, Isabel Gallotti entende que os processos
deveriam ser deslocados da Justiça estadual para a Justiça Federal,
anulando-se todos os atos decisórios proferidos após o pedido de
intervenção da instituição financeira.
Intervenção
simples
A
ministra Nancy Andrighi apontou que a CEF vem requerendo
indistintamente seu ingresso em todos os processos que tratam de
seguro habitacional, sem demonstrar se envolvem apólice pública e
se haverá comprometimento do FCVS, com risco efetivo de exaurimento
da reserva técnica do Fesa.
A Seção
decidiu que, quando for possível a intervenção da CEF, esta deve
ocorrer de forma simples, sem anulação dos atos já proferidos,
passando a competência, então, à Justiça Federal.
“Não
se trata apenas de evitar o desperdício de anos de trâmite
processual em detrimento dos mutuários – parte notoriamente
hipossuficiente –, mas também de preservar a paridade de armas, a
boa-fé e a transparência que deve sempre informar a litigância em
juízo”, disse a ministra.
A Seção
definiu que pode haver interesse da CEF nas ações envolvendo seguro
em contratos celebrados de 2 de dezembro de 1988 a 29 de dezembro de
2009 – período compreendido entre as edições da Lei 7.682/88 e
da MP 478/09 – e nas hipóteses em que o instrumento estiver
vinculado ao FCVS.
O
ingresso na ação, explicou Nancy Andrighi, depende de a instituição
provar documentalmente o seu interesse jurídico, e não apenas da
existência da apólice pública. Segundo a ministra, é preciso
demonstrar o comprometimento do FCVS, com risco efetivo de
exaurimento da reserva do Fesa – o que, para ela, é uma
possibilidade remota, tendo em vista que o fundo é superavitário.
Fonte:
Site STJ
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