A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou nesta sexta-feira (20), em Quito (Equador), que a discussão sobre a violência contra a mulher ganhou os espaços públicos e tornou mais difícil a defesa do agressor e da estrutura institucional, estatal ou privada, contra as mulheres. A ministra observou que embora a igualdade de gênero tenha chegado às normas jurídicas, é necessário se perguntar se a prática corresponde ao discurso. A ministra representa o STF no Primeiro Encontro Internacional sobre “Justiça Constitucional e Perspectiva de Gênero”, promovida pelo Tribunal Constitucional equatoriano.
A ministra observou que, no Brasil, os avanços nesta questão têm sido significativos nos últimos anos, inclusive com a eleição de uma mulher para ocupar a Presidência da República, com voto direto dos cidadãos. Ressaltou, entretanto, que embora sejam capazes dessa resolução política, as mulheres ainda não participam do processo político em condições de igualdade com os homens. Destacou ainda que o número de deputadas atualmente, além de ser menor que em legislaturas passadas, corresponde a menos de 10% de todos os parlamentares.
“Além disso, as agressões constantes e graves que as mulheres continuam a sofrer, especialmente nas classes sociais mais vulneráveis, mostram que os avanços não ocorrem de forma linear e uniforme e que a luta para garantir os direitos não pode cessar”, apontou. A ministra Cármen Lúcia explicou que, no Brasil, a Lei Maria da Penha, cujo nome homenageia uma vítima da violência doméstica praticada pelo marido ao longo de 23 anos de casamento, prevê a possibilidade de o Ministério Público propor ação penal contra o infrator, sem depender da vontade expressa da vítima, com o objetivo de evitar a impunidade em decorrência do medo de represálias ou de perda da guarda dos filhos.
A ministra recordou que, apesar da base constitucional da lei, o entendimento de que se trata de ação incondicionada ocorreu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4424), quando o STF, por maioria de votos, concluiu ser dever do Estado punir o que é considerado delito, independentemente da vontade da vítima. “O que acontece em quatro paredes, de forma violenta e criminosa, não é amor, mas cena de crime”, frisou a ministra. A ministra também citou a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 54, em que o Tribunal se posicionou favoravelmente à possibilidade de mulheres em gestação de fetos anencéfalos decidirem pela interrupção da gravidez.
Ela ressaltou que o julgamento, além de ter grande impacto na sociedade em decorrência do tema que agrega fatores ideológicos, crenças religiosas e implicações para a medicina pública e privada, marcou uma nova forma de atuar da Corte, com a realização de audiências públicas para ouvir diretamente a manifestação de diversos setores da sociedade.
O Primeiro Encontro Internacional sobre “Justiça Constitucional com Perspectiva de Gênero” organizado pela Corte Constitucional do Equador, conta com a participação de juízes da Colômbia, República Dominicana, Costa Rica, Argentina, Chile, Bolívia, Venezuela, Brasil e Equador. O objetivo é proporcionar o intercâmbio sobre os avanços jurisprudenciais, argumentação jurídica e articulação de experiência na resolução de casos sobre o tema. Ao fazer a abertura do encontro, o presidente da Corte Constitucional do Equador, Patricio Pazmiño Freire, ressaltou que os dados mostram que as mulheres que sofreram a maior incidência de violação de direitos são aqueles que vivem na pobreza. “Esta tensão reafirma que a natureza do combate à discriminação de gênero envolve uma luta contra a exploração e a desigualdade social”, concluiu.
Fonte site STF
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