“Não, não quero ser um homem. Prefiro reivindicar os meus direitos e ser uma mulher.” A fala da mulher libanesa equivale à luta das irmãs Mirabal. As dominicanas Patria, Minerva e Maria Teresa, conhecidas como Las Mariposas, foram brutalmente assassinadas porque se opuseram à ditadura de Rafael Trujillo.
Presas
e torturadas por diversas vezes, elas não desistiram de lutar contra o
regime, até que, no dia 25 de novembro de 1960, foram apunhaladas e
estranguladas. Em 1999, a Assembleia-Geral das Nações Unidas consagrou a
data como o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra a
Mulher para conscientizar o mundo sobre o drama que aflige tantas
mulheres.
Dignidade, respeito e liberdade para as mulheres são
reivindicados e estabelecidos em tratados internacionais e leis
internas, como a Lei Maria da Penha, mas as estatísticas mostram que ainda há muito a ser feito para desestimular a prática da violência.
Estudo
divulgado pela Organização Mundial de Saúde mostra que um terço das
mulheres já sofreu algum tipo de violência, que o número de mutilações
genitais gira em torno de 100 milhões a 140 milhões e ainda que 7% das
mulheres correm risco de ser vítimas de estupro ao longo da vida.
Quanto ao Brasil, um dado preocupante do Conselho Nacional de Justiça aponta que o país está em nono lugar no ranking de homicídios contra mulheres. Tanta violência se reflete no grande número de processos que chegam ao Poder Judiciário.
Ação incondicionada
Em
fevereiro de 2012, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade
4.424, o Supremo Tribunal Federal conferiu nova interpretação ao artigo
41 da Lei 11.340/06, de forma a estabelecer a natureza pública
incondicionada da ação nos casos de lesões corporais leves praticadas
por meio de violência doméstica e familiar.
Posteriormente, o
Superior Tribunal de Justiça (STJ) passou a afastar a necessidade de
representação da vítima para o processo e julgamento desse crime. “Ainda
que a vítima tenha manifestado em sede policial o seu desinteresse no
prosseguimento do feito, o certo é que a sua concordância ou não com a
instauração de ação penal contra o recorrente mostra-se irrelevante, uma
vez que se está diante de delito cuja ação penal é incondicionada, cuja
titularidade é do Ministério Público”, afirmou o ministro Jorge Mussi,
quando do julgamento do RHC 45.444.
Veja mais decisões a respeito do tema na Pesquisa Pronta denominada “Natureza da ação penal em caso de violência doméstica contra a mulher”.
Avanço
A
Lei Maria da Penha, que completou oito anos de vigência, representou um
grande avanço para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar
contra a mulher. Entre outras mudanças, possibilitou a prisão em
flagrante ou a prisão preventiva dos agressores, passando a vedar o
estabelecimento de penas alternativas, como o pagamento de cestas
básicas – punição que era bastante comum antes da promulgação da lei.
Permitiu
a aplicação de medidas protetivas, como o afastamento do agressor de
casa, seu distanciamento da vítima, a proteção dos filhos e o pagamento
provisório de pensão alimentícia. Além disso, a proteção às vítimas foi
estendida aos casos de violência física, sexual, psicológica, moral e
patrimonial.
O STJ tem contribuído para uma evolução
interpretativa da lei ao invocá-la nos casos de violência praticada não
apenas por cônjuges e companheiros, mas por namorados, irmãos, netos e
outros homens que convivem, se relacionam ou já se relacionaram com as
mulheres agredidas, mesmo que não coabitem com elas.
Em junho de
2012, a Sexta Turma do tribunal enquadrou à norma um caso de ameaça de
morte contra mulher feita por irmãos, que já não residiam na mesma casa e
nem mesmo tinham relação de dependência financeira com ela (HC 184.990).
Em
outro julgado semelhante, a Quinta Turma decidiu que a aplicação da Lei
Maria da Penha independe da existência de coabitação entre o sujeito
ativo e o passivo, bastando que estejam presentes as hipóteses previstas
no seu artigo 5º (REsp 1.239.850).
Âmbito civil
Em
fevereiro deste ano, o STJ inovou mais uma vez quanto à interpretação
da Lei Maria da Penha. Na ocasião, os ministros da Quarta Turma – que
julga direito privado – consideraram que as medidas protetivas previstas
no texto legal não são necessariamente preparatórias de qualquer ação
judicial, porque “não visam processos, mas pessoas”.
De acordo com o relator do REsp 1.419.421,
ministro Luis Felipe Salomão, essas medidas podem ser buscadas de forma
autônoma para cessar ou acautelar a violência doméstica contra a
mulher, independentemente da existência de processo criminal ou ação
principal contra o suposto agressor. “O fim das medidas protetivas é
proteger direitos fundamentais, evitando a continuidade da violência e
das situações que a favorecem”, disse Salomão.
Tribunal do júri
O
Tribunal da Cidadania firmou jurisprudência no sentido de que é do
tribunal do júri a competência para processar e julgar os crimes dolosos
contra a vida, ainda que sejam cometidos em contexto de violência
doméstica (HC 145.184). Para ter acesso a outros julgados sobre esse tema, acesse a Pesquisa Pronta denominada “Competência nos crimes dolosos contra a vida da mulher praticados no âmbito doméstico e familiar”.
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